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Enjoy the silence! Os benefícios da prática do silêncio

Saber calar para aprender a ouvir, sentir e pensar. Pode parecer fácil, mas não é. O que é estar em silêncio, afinal? A lista de poluição sonora engloba fatores como overdose de informação, comunicação truncada pelas tecnologias e redes sociais e o excesso de ideias e pensamentos que não saem da cabeça. “Ficar em silêncio coloca você em contato com suas emoções, muitas delas negativas, e permite domesticá-las para que não tomem conta da mente”, disse à Vogue a monja budista francesa Kankyo Tannier, autora do livro A Magia do Silêncio (editora Sextante), recém-lançado no Brasil. Apontada como a voz pop do budismo atual, Kankyo sugere a ação como aliada da saúde mental e emocional, espécie de antídoto contra a ansiedade. “O silêncio se choca com nossa necessidade de sermos vistos e ouvidos. É por isso que muita gente se sente pouco à vontade quando precisa permanecer calada”, completa.

A ciência certifica o que muita gente vem adotando como prática. “A ausência de estímulos ativa o que chamamos de rede de modo padrão: um conjunto de conexões neurais relacionadas ao processamento de memórias e emoções”, explica Fabio Porto, neurologista do Hospital das Clínicas da Universidade de São Paulo (USP). Ao aquietar o diálogo interno, o cérebro entra em repouso e amplia-se o espaço para lidar com problemas e processar conhecimento.

Não à toa, muito além da meditação tradicional, abriu-se um leque de alternativas. O esporte é uma delas. Em junho deste ano, a marca japonesa Asics montou uma pista fechada de corrida em Londres para um experimento de mindful running, no qual atletas completaram cinco quilômetros no escuro, sem música. O objetivo era testar o comportamento da mente em um ambiente livre de estímulos, com a corrida como experiência meditativa. Na moda, a grife À La Garçonne, de Alexandre Herchcovitch e Fábio Souza, apostou em algo similar em seu desfile, em março deste ano. Na Biblioteca Mário de Andrade, em São Paulo, modelos atravessaram a passarela ao som das batidas dos sapatos no chão, tecidos em movimento e o burburinho de surpresa da plateia. Sem distrações, a atenção plena ficou na roupa.

Nos Estados Unidos, a febre do silêncio se propaga nos eventos da Sound Off, que oferece festas, aulas de ioga, concertos no meio da floresta, jantares comemorativos e sessões de cinema que, para quem está de fora, parecem estar em volume zero. Neles, os participantes usam fones sem fio o tempo todo, por onde escutam música e orientações diretamente no ouvido, o que elimina desatenções externas, aumenta a conexão com o corpo e a mente e intensifica a imersão.

Embora em outro contexto, a finalidade é a imersão total, almejada também em retiros espirituais que, em alta, atraem até mesmo os não espiritualizados. A Fundação Arte de Viver, ONG presente em vários países e que se dedica a propagar práticas de combate ao estresse, realiza mensalmente retiros de silêncio em várias capitais brasileiras. Normalmente com duração de quatro dias, ali ficam banidas não só as conversas (mesmo que por gestos), mas também música e leitura. Meditação e serviços comunitários preenchem o tempo. “Estamos acostumados a falar e pensar demais no dia a dia e isso nos distrai de nós mesmos. A ideia de se retirar da rotina é ficar sozinha com sua mente e reconectar-se consigo”, esclarece Cristina Armelin, instrutora de meditação e respiração da instituição.

Há ainda alternativas mais radicais para quem quer, literalmente, se isolar do mundo exterior e relaxar profundamente. É o caso dos tanques de flutuação, inventados por volta dos anos 50 e bastante popularizados nos 70 nos Estados Unidos. Parecidos com uma cápsula ou banheira com tampa, isolam o som e a luz enquanto o corpo boia sem esforço graças ao sal especial adicionado à água morna. Assim, livre de estímulos e da ação da gravidade, ouve-se apenas a respiração e o batimento cardíaco, fazendo com que os usuários entrem em uma frequência de ondas cerebrais semelhante à do estado meditativo. Hoje, existem milhares de centros também na Europa e na Austrália; no Brasil ainda são poucos locais – como o Flutuar Float Center, no bairro de Pinheiros, em São Paulo.

Por qualquer que seja o caminho, a sugestão é desacelerar. “Quando a mente trabalha no automático, você perde a capacidade de viver o que está acontecendo e de escolher como agir em cada situação. O mais comum é reagir por impulso”, diz o irlandês Stephen Little, diretor do Centro de Vivência em Atenção Plena, em São Paulo. Para ele, pausas silenciadas ao longo do dia podem ter efeitos parecidos como de pegar uma estrada de terra sem conhecer o destino final, depois de horas dirigindo em uma rodovia asfaltada: instiga o olhar para o novo. Ouviu?

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