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‘The New Look’: atores comentam sobre os personagens do drama de época

Vogue entrevistou Juliette Binoche (Coco Chanel), Maisie Williams (Catherine Dior), Ben Mendelsohn (Christian Dior) e John Malkovich (Lucien Lelong) sobre os respectivos papéis e o impacto da série na percepção de cada um

The New Look era uma das minisséries de moda mais aguardadas de 2024. Inspirada em fatos reais, a produção original da Apple TV+ remonta a cena da moda parisiense em um dos momentos mais complexos da história recente, a Segunda Guerra Mundial, e o que aconteceu após o término dos conflitos. Christian Dior, Coco Chanel, Lucien Lelong e outros grandes nomes compõem o drama de época que vai muito além dos looks pensados pelos estilistas.

Vogue Brasil conversou com parte do elenco principal, composto por Juliette Binoche, Maisie Williams, Ben Mendelsohn e John Malkovich, sobre os desafios de interpretar cada personagem, as complexidades do período (e como isso se reflete nas decisões deles na época) e mais. Confira a seguir:

Mesmo sem saber nada (nadinha mesmo) sobre a vida de Christian Dior antes de ser cotado para o papel, Ben Mendelsohn não hesitou em dizer sim. “Todd [A. Kessler, produtor executivo] estava em casa fazendo uma pizza e me contou sobre a biografia de Dior que estava lendo, fascinado pelo quanto a vida pessoal dele era muito distante da vida pública; que era um homem reservado. Aquilo me instigou. Aprendi muito sobre ele, mas não sou especialista. E também não queria tentar ser igual a ele, andei mais pelo caminho de escrever uma carta de amor para Dior.”

Visivelmente entregue para a experiência, Ben interpreta o estilista de maneira poética e profunda. “Lembro de ter um período de duas semanas durante as gravações que foi o momento que mais trabalhei na vida, me entreguei para essas emoções. É muito intenso atuar nesse luto forte e nesses sentimentos de devastação, mas sinto que meu superpoder é a preocupação com o público. Para mim, é essencial que a audiência tenha a experiência completa, então sempre dou o melhor que consigo para aquilo.”

Na trama, Christian Dior passa por situações muito introspectivas, não só relacionadas à sua ideia de querer ter a marca própria e sair das asas de Lucien LeLong, mas também por conta da sua irmã, Catherine. “A relação deles é como de qualquer irmão, se conhecem bem, às vezes brigam, discordam… Mas quando ela vai embora, o mundo dele acaba. Para mim, é até difícil comentar isso porque relembro de tudo o que fiz para conseguir interpretar esses momentos”, diz, emotivo. “Ele faz de tudo para trazer a beleza de volta ao mundo, a fragrância, Miss Dior… E Catherine é extraordinária.”

Outro ponto importante para Christian Dior, principalmente durante a guerra, é a amizade que tem com outros estilistas. “Eles podem não ter tido uma irmandade tão coesa, mas essa fraternidade permaneceu íntegra nesse período. E isso fica nítido quando ele resolve abrir a própria marca e não quer, por nada, ‘roubar’ as costureiras dos seus colegas. Acho que ele não teria sobrevivido à experiência se não fosse por Jacques, seu companheiro, Balenciaga também, Lelong.”

Coco Chanel
Do contrário, a personagem vivida por Juliette Binoche era uma mulher solitária, angustiada com a captura de seu sobrinho pelos nazistas, tentando entender como sobreviver, mais uma vez, ao horror que atravessava a sua vida. “Para interpretá-la, senti que a minha responsabilidade enquanto atriz era dar humanidade à ela. Coco veio de uma infância desprovida de afeto, dinheiro, cuidado. Sua mãe morreu na frente dela quando tinha apenas 11 anos, o pai abandonou a família. Ela foi deixada em um orfanato, uma das irmãs se matou e a outra foi encontrada morta mais tarde, na América do Sul. Uma família dispersa. Mais tarde, perdeu o grande amor da vida em um acidente de carro. Ela era sozinha, estava deprimida”, conta a atriz, que leu muitos livros e fez pesquisas para compreender a figura ambígua de Chanel.

A única pessoa que lhe restou foi o sobrinho. Portanto, fez de tudo para resgatá-lo da prisão, o que significou uma aproximação com o alto escalão da SS. “Ela era amiga de todos os artistas, aristocratas, músicos e pessoas importantes da época [antes da guerra]. Ela vinha de um contexto de sobrevivência, um instinto que a ajudou a mudar a própria vida. Existia uma liberdade nela, embora tivesse uma distância que aprendeu a ter por conta de todas as tragédias e dificuldades que passou. Então, depois de ter tido tantos contatos e relacionamentos, por que não um alemão? Não podemos olhar para isso com uma perspectiva externa, de hoje. É compreensível que haja um questionamento diante das suas escolhas naquela época, mas é mais interessante ver o ponto de vista interno dela. Eu não faria o que ela fez, mas compreendo suas escolhas”, diz.

A caracterização de Juliette Binoche é impressionante, em algumas cenas é possível lembrar vividamente de imagens clássicas de Coco Chanel. “A equipe de figurino e maquiagem foi fantástica. Minha parte preferida era chegar de manhã no set e escolher, entre caixas enormes cheias de acessórios, as pulseiras, colares e anéis que iria usar. Normalmente, o pessoal que cuida do som e da trilha sonora odeia esses barulhos (risos), mas pela primeira vez pude usar esses adereços sem me preocupar com isso.”

Catherine Dior
Interpretada lindamente por Maisie Williams, a irmã mais nova de Christian Dior tem a história prévia ao Miss Dior, perfume ícone da maison dedicado à ela, contada de maneira profunda e respeitosa. Membra da Resistência Francesa, Catherine lutou contra a invasão nazista na França, mas foi pega e levada primeiro para uma violenta interrogação e, depois, destinada a um campo de prisioneiros. Na série, Monsieur Dior tem todo um arco dramático em relação a essa perda ou possível perda e o vazio que causa na sua rotina a ausência de sua irmã mais nova.

“Para fazer o papel, mergulhei no livro Miss Dior, escrito por Justine Picardie, que explora a vida dela em muitos detalhes por meio de relatos de outras mulheres. A partir dele, e da sorte que tive de poder conversar com pessoas que a conheceram, senti que poderia começar a rascunhar um retrato de quem foi Catherine”, conta Maisie à Vogue. Ela ainda fez um trabalho com um treinador de sotaque, para conseguir alcançar o francês, e, claro, viver e atuar em Paris durante as gravações também foi um ganho.

Sobre a complexa e profunda conexão com o irmão mais velho da personagem, a atriz acredita que o vínculo ajudou Christian Dior a não desistir da sua essência criativa. “Ela realmente entendia e aceitava ele por quem ele era. Embora eles estivessem em momentos de vida totalmente diferentes, Ben e eu buscamos destacar como é um relacionamento real entre irmãos.”

Após ser capturada pelos nazistas, Catherine passa por situações horríveis, de violência física e psicológica que a marcam para sempre. “Tento olhar para isso como uma oportunidade, enquanto atriz, de fazer justiça para a figura que ela era. Me senti muito honrada de aprender sobre Catherine e isso é o que mais me entusiasma: pensar que as pessoas podem conhecer mais sobre essa mulher que, apesar de não ser lembrada quando pensa-se em moda, foi uma parte extremamente relevante na vida de Dior. Trazê-la ao público é algo importante, sim”, reflete.

Um tempo depois de retornar para casa, ainda no processo de compreender tudo aquilo que passou, Catherine Dior recebe honrarias pelos feitos em prol da população francesa e judaica (mesmo não sendo judia, ela lutou por eles, vale dizer), se tornando um símbolo importante na história da Resistência. E uma das coisas que a fez colocar os pés no chão, até para superar (se é que é possível) o trauma, foi entrando em contato com a natureza, algo que já fazia desde a infância. Ela decide viver na casa que era do pai, afastada de Paris, cultivando as flores tão queridas pela família – daí que, mais tarde, viria a se tornar responsável pela divisão de perfumes da maison Dior.

“Depois que uma pessoa passa por algo assim, é muito difícil reconstruir a vida. E Catherine voltou para a terra, para o mundo natural, cultivou flores: isso é extremamente simbólico. Talvez ela nem tenha feito isso com certa consciência, mas olhando a situação de fora, sinto que ela floresceu após a guerra, como se estivesse cultivando algo novo. Acho isso especialmente bonito. Sem contar que ela era uma pessoa com aquele olfato especial, bem de perfumista. Algumas nascem com esse dom, e Catherine foi uma dessas pessoas.

Visivelmente feliz e emocionada em poder interpretar este papel, Maisie Williams compartilha que a lição mais importante que aprendeu com a personagem foi o fato dela não ter se colocado num lugar de heroína. “Ela estava apenas fazendo o que achava ser o certo. Mas quando você tira o zoom e observa o impacto que aquela mulher teve na história, é algo inacreditável. Penso que no momento em que você está vivendo a sua vida, você tem que apenas permanecer no seu caminho e se concentrar no que está à sua frente. É justamente isso que vou levar comigo.”

Lucien Lelong
Talvez o personagem mais desconhecido do grande público seja ele, vivido pelo sempre ótimo John Malkovich. Costureiro e filho de Arthur Lelong, herdou a loja do pai e deu continuidade, expandindo o negócio de moda. Apesar de ter bons contatos, saber os melhores fornecedores de tecidos nobres e ter uma clientela de dar inveja, Lucien não era estilista, ele contratava nomes como Christian Dior e Pierre Balmain (antes de serem que viriam a ser) para dar conta dos croquis, das modelagens, das provas de roupas com as clientes e das apresentações para compradores. Durante o período em que a série se passa, vemos a relação próxima que mantém com Dior, antes dele partir para o sonho da marca própria, e a sua posição diante da expertise francesa de alta-costura permanecer na França – e não ir para a Alemanha, como os nazistas queriam. “Seu talento era reconhecer talentos e incentivá-los a criar”, define o ator.

Sem qualquer conhecimento prévio sobre o personagem, John Malkovich se debruçou sobre livros a respeito da história desta figura e estudou metodicamente o roteiro criado para a série. “Eu sabia muito mais sobre Balenciaga, por exemplo, porque tinha ido ao museu na Espanha. Reitero, contudo, a importância dele para manter funcionando o negócio da moda francesa. E é sempre interessante para mim no drama, separado da moralidade, ver as adaptações que as pessoas fazem e diriam que fariam com a vida e as circunstâncias ao seu redor em vários momentos. E essa foi uma época de muitas adaptações. Então, se ele não tivesse feito seus estilistas criarem vestidos para esposas e amantes nazistas, não acho que ele ou a sua marca durassem muito.”

Na história, ele passa boa parte do tempo com Christian Dior, e a dinâmica de atuação com Ben Mendelsohn engrandece essa amizade complexa deles. “Ele é bastante elétrico”, brinca sobre o colega de cena. “Eu o vi pela primeira vez anos atrás no filme australiano Animal Kingdom e achei a sua atuação espetacular. A diferença entre ele e outros atores é que Ben é sempre espetacular em cena, é muito talentoso e fascinante – não apenas de trabalhar, mas de conviver também.”

O relacionamento era de altos e baixos, marcado por muito respeito entre ambos nos momentos mais difíceis e delicados. “Dior era uma figura difícil, assim como muitas pessoas criativas são. Ele era, eu diria, hipersensível. Uma daquelas pessoas que pode até estar um pouco deslocada neste mundo por causa de uma sensibilidade exacerbada. E Lelong, na maior parte, foi capaz de administrar isso e tirar o melhor proveito dele”, define.

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