Moda

‘Somos Guardiões’: o que a moda pode aprender com a luta de ativistas contra o desmatamento

Enquanto a indústria do couro e algodão estão diretamente ligados a destruição das florestas, novo filme aponta que a solução para o desmatamento está nas mãos de indígenas e populações locais

A destruição das florestas não apenas afeta a biodiversidade e as comunidades locais, mas tem repercussões que se estendem a toda humanidade, pois esses ecossistemas são cruciais para a manutenção da vida e do equilíbrio climático global. Com as mudanças climáticas cada vez mais evidentes, surge a necessidade de identificar os responsáveis e reconhecer aqueles que estão na linha de frente na proteção das florestas.

A pecuária brasileira é a principal causa do desmatamento na Floresta Amazônica e também impacta drasticamente outros territórios como o Cerrado. Este setor é impulsionado pela alta demanda global por carne bovina e couro – que majoritariamente é usado para fabricar diversos produtos de moda, como bolsas e sapatos. De acordo com um relatório da organização Stand.Earth, mais de 100 marcas internacionais de moda estão adquirindo couro de áreas desmatadas ilegalmente na região, destacando a conexão direta entre moda e devastação ambiental.

Além da pecuária intensiva, existem outras explorações no território, como mostra o filme recém-lançado, Somos Guardiões, disponível na Netflix, que acompanha a vida e a luta do indígena Marçal Guajajara e da ativista Puyr Tembé, que evidencia a resistência das comunidades locais. Por meio de uma narrativa centrada nos personagens, o filme aborda desde a ciência da Floresta Amazônica até os impulsionadores econômicos do desmatamento, unindo política, história, economia, ciência e consciência.

O filme aborda o desafio daqueles que lutam com as próprias mãos contra um grande sistema que envolve dinheiro e poder, e logo incentiva um modelo de atuação coletiva, baseada nos conhecimentos de populações originárias. A ativista Puyr Tembé traçou seu caminho da Terra Indígena Alto Rio Guamá para hoje estar na linha de frente do movimento indígena, ela dedica sua vida a incentivar o envolvimento indígena nas esferas políticas no Brasil e no mundo. “É dever dos indígenas ocupar espaços de poder, decidir nossas vidas”.

Somos Guardiões vai além de ser apenas um filme, é um movimento, uma campanha com o propósito de influenciar governos, empresas e a sociedade civil a adotarem práticas mais robustas em relação à proteção da Amazônia e de seus povos, promovendo sua resiliência e regeneração. Quando o debate do desmatamento é analisado dentro da indústria da moda, poucas empresas apresentam comprometimentos sérios e ações de impacto positivo a longo prazo.

No relatório Índice de Transparência da Moda 2023, que avalia a disponibilidade de dados públicos das maiores marcas com operação no Brasil, somente 10% das marcas analisadas divulgam um compromisso mensurável e com prazo determinado para o desmatamento zero. O relatório ressalta a complexidade da cadeia de fornecimento do couro e aponta a participação do setor global levantando que a indústria brasileira do couro gera aproximadamente US$ 1,1 bilhão em receita e 80% de seu volume é exportado para aproximadamente 80 países. Por exemplo, a Itália, que é um país internacionalmente conhecido por seus artigos de couro, é o terceiro maior importador de peles parcialmente processadas de fazendas de gado no Brasil.

Outro ponto de destaque em relação a moda com o desmatamento, é a produção em larga escala de algodão transgênico no Cerrado, uma das principais commodities do território. Enquanto essa produção coloca o Brasil como um dos maiores produtores de algodão do mundo, que ainda é vendido como “sustentável”, os impactos da devastação atingem diretamente a biodiversidade e a qualidade de vida das populações locais.

A abordagem do filme também inclui o apoio a campanhas de defesa da Amazônia, fortalecimento de vozes indígenas e a promoção da descolonização e do respeito pelos direitos dos povos indígenas. O objetivo é criar uma mudança sistêmica que promova uma relação mais equitativa e sustentável entre a sociedade e a floresta amazônica, garantindo sua preservação para as gerações futuras. As táticas incluem facilitar doações, organizar exibições do filme gerando sensibilização, construir comunidade nas mídias sociais, fortalecer parcerias estratégicas, educar a juventude e fornecer ferramentas e recursos para capacitar as pessoas a se tornarem guardiões e assim participarem ativamente na reflorestação.

Aprender a traçar caminhos de fortalecimento das comunidades é uma tarefa importante para o setor da moda, que historicamente impulsiona uma cultura de competição e exclusividade. Ampliar a visão para entender de onde vêm as matérias-primas, como elas impactam as pessoas e a natureza, se posicionar como um setor criativo que se importa com a realidade global e assim fomentar iniciativas que zelam territórios ameaçados, são possibilidades.

Portanto, transcender a proteção da Amazônia, inspirar e agir por uma mudança sistêmica em direção a uma relação mais equitativa e sustentável entre a humanidade e o meio ambiente, é o que vai garantir um futuro viável para essa e as próximas gerações.

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