Em 2050 teremos mais plástico do que peixes nos oceanos. Estamos transformando o mundo em um grande lixão a céu aberto. O Brasil é o quarto maior produtor de plástico do mundo e recicla apenas 1,28% do que coloca no mercado.
Tudo isso é verdade e tira meu sono constantemente pensar que, como seres humanos, estamos caminhando rapidamente para destruir o que nos mantém vivos aqui. Voluntariamente. E para consumir mais.
Mas os dados apresentados acima são apenas a consequência de um modelo econômico e cultural que nós mesmos criamos, e se isso é consequência, qual seria a causa? Por que compramos o que compramos? Por que esquecemos que somos natureza? Por que nos desconectamos tanto do que de fato nos faz felizes? Essas perguntas não têm respostas óbvias, e na maior parte do tempo fazemos tudo tão no automático que nem pensamos nos porquês, afinal, estamos tão sem tempo, ocupadas com…redes sociais, por exemplo, que não dá pra pensar. Né? Ou ocupadas em atender alguma expectativa da sociedade, como ir ao salão e estar com cabelos e unhas feitas. A gente até diz pra gente que vamos ao salão porque queremos nos sentir bonitas, mas bonitas na concepção estética de quem? E pra quem?
Tenho refletido muito sobre a opressão que o patriarcado causa no mundo, e em nós, mulheres. Esse modelo econômico linear, leia-se, extração de matéria-prima, produção de um bem e descarte dele (seja lá de que forma) está levando a humanidade a um colapso ambiental, e sem equilíbrio a vida fica comprometida, ou impossível. Os valores da sociedade capitalista estão intimamente ligados aos da sociedade patriarcal, baseados em “conquistar territórios, guerrear com países concorrentes, crescer mais e mais e infinitamente num planeta com recursos finitos”. Mas crescer infinitamente num modelo baseado em recursos finitos não se sustenta, e mesmo assim seguimos fazendo da mesma forma e querendo os crescimentos de 2 dígitos na nossa empresa, no nosso país, no nosso salário, para… comprar coisas. Que não precisamos. Para atender às expectativas do outro. Que mais causam frustração do que felicidade.
O apego a esses valores do patriarcado, às vezes disfarçados de influências da moda, ou de Youtubers e blogueiras, mais causa aprisionamento do que libertação. E aí mais uma vez se revela a lógica da opressão. Disfarçada e glamourizada, mas sim, opressão. Porque enquanto estamos sendo bombardeadas de informações e imagens que devemos seguir, de fórmulas mágicas de magreza e beleza e saúde atreladas a produtinhos e tratamentos mágicos, estamos ainda vivendo sob uma lógica da opressão intimamente ligada ao patriarcado. E em última instância, estamos reproduzindo comportamentos que nos aprisionam. Mas se isso só impactasse a nós mesmas, poderíamos continuar escolhendo livremente seguir essa ou aquela tendência. O problema é que isso está causando a todos que vivem nesse planeta um impacto. E dos grandes. Se todos consumissem como os americanos, precisaríamos de 7 planetas. E só temos um. Não temos plano B.
E com as mudanças causadas pelo caos climático quem mais vai sofrer (e já sofre) são justamente as mulheres, e as mais pobres. Então não, não podemos mais seguir no piloto automático nem no comportamento que só beneficia o indivíduo. A notícia boa é que a mudança está nas nossas mãos. Hoje nossas escolhas de consumo são nosso poder de voto, e com elas podemos ajudar a construir (ou destruir) o mundo onde queremos viver. Eu parei de pintar as unhas, por exemplo, algo que pode parecer simples e bobo, mas existem sete substâncias tóxicas e alergênicas nos esmaltes, que fazem mal à minha saúde e ao planeta. Mas mais do que isso, parar de pintar a unha é um ato de rebeldia contra o padrão imposto pela nossa sociedade de que mulheres têm que estar com as unhas feitas. A ligação entre opressão e destruição do planeta não é tão óbvia, mas se a gente mergulha na segunda camada, ela tá logo ali.
Eu acredito muito que seremos nós as mulheres que vamos liderar o movimento de regeneração que precisamos como sociedade. Regeneração do meio ambiente, mas também dos valores, das relações, da espiritualidade e da forma como vivemos em comunidade. Regeneração do nosso papel aqui nesse planeta tão lindo, vivo e tão cheio de oportunidades. Regeneração da alegria que é inerente ao ser humano e que às vezes se perde no medo, e na opressão.
Em suma, nós somos aquelas por quem estávamos esperando. E esse momento chegou. Que tal adiar sua próxima ida ao salão? Que tal pensar se você precisa mesmo de um vestido novo? Que tal usar seu poder de consumidora para construir aquele mundo onde nós gostaríamos de viver? Vamos juntas?
*Fe Cortez é ativista ambiental e idealizadora da plataforma de educação ambiental Menos 1 Lixo e do copo do movimento. Foi apresentadora do programa da Discovery Home & Health, Menos é Demais. Em 5 de junho celebra-se o Dia Mundial do Meio Ambiente