O Transtorno do Espectro Autista (TEA) é uma condição que apresenta três características principais de acordo com o portal Drauzio Varella: dificuldade de comunicação, dificuldade de socialização e padrão de comportamento restritivo e repetitivo, além do uso da imaginação para lidar com jogos simbólicos. O nível de funções cognitivas e intelectuais de autistas varia bastante, podendo gerar um maior comprometimento dessas habilidades ou ter um impacto mais sutil.
De acordo com dados da Organização Mundial de Saúde (OMS), estima-se que 1 a cada 160 crianças em todo o mundo tenha TEA, mas há uma enorme disparidade nos diagnósticos por gênero, como os dados divulgados no Reino Unido apontam.
No Dia Mundial de Conscientização do Autismo, celebrado hoje (2), números oficiais divulgados no Reino Unido indicam que há cerca de 700 mil pessoas no espectro de autismo, com uma proporção de, aproximadamente, dez homens para uma mulher.
Mas e se esse número for tendencioso quanto ao gênero do paciente? Novas pesquisas realizadas no mesmo país apontam para a possibilidade de que a proporção real entre homens e mulheres autistas está próxima de 3 pra 1.
O dado sugere que milhares de meninas e mulheres estão convivendo com o autismo e nem sequer têm consciência disso, como foi o caso da escritora e empresária britânica Alis Rowe. Ela descobriu que era autista quando adulta, aos 22 anos de idade.
“Passei toda a vida me perguntando por que era ‘diferente’, me sentindo aterrorizada por isso e tentando me adequar”, revela. O diagnóstico, diz ela, transformou a sua vida, trazendo “paz de espírito, a sensação de estar encerrando um ciclo e autoaceitação”, disse ela à BBC.
A importância do diagnóstico
“Hoje, posso explicar aos amigos e colegas que tenho dificuldades e que meu pensamento e comportamento podem ser um pouco ‘incomuns’. Tudo isso levou, no fim das contas, à uma melhora da minha saúde mental e a relacionamentos mais significativos e agradáveis”, detalha.
O caso de Alis demonstra a importância do diagnóstico de autismo. Muitas pessoas, ao saberem de sua condição, podem se aceitar e serem compreendidas por familiares e amigos. Além disso, descobrir que é autista pode ajudar a descobrir outras patologias, como depressão, ansiedade e automutilação. Um estudo realizado no Reino Unido mostra que 23% das mulheres hospitalizadas por anorexia apresentavam também sintomas de autismo.
Por que, então, muitas mulheres não recebem o diagnóstico de autismo?
Existem diferenças entre os sinais de autismo entre meninas e meninos e, por isso, muitas vezes eles são passados despercebidos. Em casos de autismo de alto funcionamento, esse problema é ainda maior, já que, neste caso, a pessoa apresenta habilidades cognitivas acima da média em comparação com outros autistas.
Os pesquisadores afirmam que meninas com autismo parecem se comportar de formas “adequadas” em comparação com os meninos. Isto é, elas aparentam ser mais retraídas, dependentes, não envolvidas nas situações que vivem ou mesmo deprimidas. Elas podem se tornar obsessivas por determinados assuntos, mas não costumam ter interesse em áreas como matemática e tecnologia.
Alis explica que, para um observador externo, pessoas que se comportam dessa maneira simplesmente “passam despercebidas”. “Ela não é considerada ‘problemática’ ou ‘desobediente’, portanto, ninguém realmente nota o que está acontecendo”, diz.
Quando o paciente é uma criança, a situação pode se agravar mais ainda e o diagnóstico pode representar o fim de uma cansativa luta, como foi o caso de Marilu*, que lutou por anos para que médicos e professores ajudassem a descobrir o que estava acontecendo com a sua filha, Sophia.
“Quando diagnosticaram minha filha com TEA, foi um grande alívio”, conta. “Mas como é que uma mãe pode sentir alívio quando sua filha de 10 anos é diagnosticada com uma doença que não tem cura e terá impacto no resto de sua vida?” Ela descreve que chegar a esse ponto foi o auge de uma “batalha para entender o que estava por trás da extrema tristeza” da menina.
Dificuldade em fazer amizade e sofrimento familiar
Marilu revela que sua filha sempre teve muita dificuldade em fazer amigos da sua idade. “Eu apenas achava que era algo que tinha a ver com o fato de ela ter nascido prematuramente.” Mas até então, ela não considerava isso um problema. “Não me preocupou que ela fosse percebida como ‘diferente’, até eu a ver sofrendo na escola. Na hora de dormir, ela dizia: ‘Não tenho amigos, mamãe, ninguém gosta de mim’”, diz ela.
Ao perguntar aos professores de Sophia o que estava acontecendo, Marilu obteve a resposta que sua filha era “hipersensível” e “muito emotiva”, sendo, até mesmo, acusada de ser mimada pela mãe. Não saber do diagnóstico da garota fazia com que toda a família sofresse. “Uma vez, eu disse a um amigo que, ao levar Sophia para a escola, parecia que a estava levando para o matadouro”.
Sophia está feliz por finalmente saber o que ela tem. “Estou aliviada, mas também um pouco preocupada. Não quero que meus colegas de classe saibam, porque não quero ser diferente, não quero que ninguém tire sarro de mim.” Ao ser perguntada se preferia não ter recebido o diagnóstico, ela nega. “Ah, não, isso tira um peso do meu coração.”