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Suas compras também podem ser políticas

Durante a Casa de Criadores, na semana passada, falamos muito sobre representatividade LGBTQ+. Teve a coleção EMO de Felipe Fanaia (com trilha ao vivo do Quebrada Queer), teve o momentinho pride madrilenho de Rafael Caetano, teve a performance de abertura de Rober Dognani com personagens icônicos da noite paulistana. E teve também os manifestos de Isaac Silva e Weider Silveiro pela luta transexual por direitos, respeito e cidadania. Foram essas duas últimas coleções, aliás, que mais emocionaram e fizeram pensar.

Sempre gostamos quando marcas que admiramos abraçam causas pelas quais lutamos ou das quais fazemos parte. Só para dar alguns exemplos recentes, rolou uma minicomoção quando a Prada lançou um vídeo-campanha com a drag queen Violet Chachki, vencedora de RuPaul’s Drag Race. Também foi bonito de ver a homenagem à diversidade e cultura LGBTQ+ do estilista Christopher Bailey no seu último desfile para a Burberry. A realidade anda tão amargurada que qualquer sinal de atenção, reconhecimento e respeito já é motivo para comemoração.

Mas não devia ser assim, não. E não dá para só aplaudir. Dá menos ainda para só aplaudir e não se informar. Pinkwashing é o termo utilizado para se referir a estratégias políticas e de marketing que se valem da cultura e das pessoas LGBTQ+ para promoverem uma imagem que pouco condiz com as práticas e ações da instituição em questão.

É a marca que apoia a parada do orgulho LGBTQ+, mas só trabalha com homens héteros. É a empresa de transporte privado com campanha sobre respeito à diversidade, mas que nada faz quando um cliente é vítima de ataque homofóbico. É a instituição financeira que patrocina exposição com temática queer, mas financia a ala mais conservadora da política. É o Estado que usa a imagem de sua população LGBTQ+ para disfarçar as violações de direitos humanos contra outras minorias.

A modelo Valentina Luz no desfile de Isaac Silva (Agência Fotosite/Agência Fotosite)

Quando Weider Silveiro começou a fazer sua coleção sobre as barreiras e a invisibilidade de pessoas LGBTQ+, ele pediu ajuda à diretora de arte e ativista pelos direitos trans Neon Cunha. “É questão de lugar de fala”, disse o estilista. A coleção de Isaac Silva era sobre a condição da mulher trans negra no Brasil. Seu casting foi composto inteiramente por modelos transsexuais e seus nomes virão bordados nas etiquetas das peças usadas por elas. Neon também tem dedo nessa história, ela atua nos bastidores da marca já há alguns anos. No caso da Burberry, a label fez doações para três instituições: a Albert Kennedy Trust, que apoia moradores de rua LGBT no Reino Unido; a The Trevor Project, organização americana que luta pela prevenção do suicídio na comunidade LGBTQ+; e a International, Lesbian, Gay, Bisexual, Trans and Intersex Association.

Estratégias de marketing com a bandeira LGBTQ+ precisam ter impactos reais nas vidas das pessoas. Empresas que levantam essa bandeira precisam fazer mais do que promover ações pontuais. Porém, não se iludam, anjos. Marca alguma fará isso por livre e espontânea vontade. Cabe a nós cobrar, fiscalizar e brigar por isso. Mostrar engajamento é legal, todo mundo gosta e dá muitos likes. Só que likes não mudam o mundo. Likes não garantem o emprego da mulher ou homem trans, não impedem o assassinato da travesti nem a agressão da bicha afeminada. Se a gente não se mexer, ninguém vai se mexer por nós.

Johnny Luxo no desfile de Rober Dognani (Agência Fotosite/Agência Fotosite)

Tá, e o que a gente pode fazer? Para começo de conversa, podemos parar de gastar com quem vai contra o que acreditamos. Parar de dar dinheiro para quem não faz nada pela gente e, mais ainda, para quem faz muito contra a gente. Sabe o pink money? Aquele monte de dinheiro que circula e vem dos LGBTs que a empresas, artistas e governos tanto querem se aproveitar? Então, vamos investir melhor. Vamos consumir de marcas que empregam LGBTs, que contribuem com instituições de apoio, que lutam pelos nossos direitos, pelo nosso respeito e por nossa visibilidade – de verdade.

Eu sei que é chato, dá uma preguiça desgraçada fazer toda uma pesquisa sobre a marca antes de comprar aquela aquela blusinha que a gente tanto quer. Mas é necessário. Não custa nada fazer uma busca rápida para checar se a label em questão não está cometendo alguma gafe ou dando algum bapho. Só para garantir que você não vai consumir de uma grife que propaga ideais ou práticas racistas, machistas, homo ou transfóbicas.

2018 é ano de eleição e já tem muita empresa anunciando para quem vai seu apoio. Temos que ficar atentos a quem são os candidatos endossados pelas marcas que consumimos. O dinheiro que você gasta com ela é o mesmo que vai financiar o projeto de lei que pode tirar direitos de muita gente – de você até. Porque não adianta fazer textão contra o presidenciável ultraconservador e comprar de quem quer ele eleito para garantir interesses privados. Do mesmo jeito que não adianta reclamar de todos os problemas que afetam a vida de LGBTs e consumir de quem só explora nossa imagem.

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